Por: João Tavares Calixto Júnior (*).
Em meio a amplo contigente de personagens históricos que pereceram na
memória do povo de Lavras da Mangabeira, está um reverendo, célebre em
sua época, ao qual aqui, referenciamos como Luis Antônio Marques da
Silva Guimarães, ou singelamente, pe. Luis do Calabaço.
Filho de Antônio Marques da Silva Guimarães e Joaquina Franscisca de
Sá, trata-se o religioso, de autor do projeto de implantação da primeira
escola pública de Sousa, PB, sua terrra natal. Foi um vigário muito
popular ao seu tempo, estando a frente da paróquia de São Vicente Ferrer
por 17 anos (1846 a 1863).
Sobre este paraibano,
caem histórias de ações curiosas, como o fato de o mesmo não residir na
casa paroquial, e sim, no sítio Calabaço, de sua propriedade, a cerca de
sete quilômetros da então vila de São Vicente das Lavras, num sobrado
construído próximo à união do riacho do Rosário (margem esquerda) com o
córrego das Emas, que inclusive, serviu de guarida a alguns membros da
célebre comissão científica de exploração, em sua estada por doze dias
em Lavras, no ano de 1859.
Teve vida marital com Joaquina Maria do Espírito Santo, conhecida por
Marica do padre Luis e com esta, formou família com mais cinco filhos
(Luis, Joaquina, Maria, Francisca e José), conforme o descrito em seu
testamento, provido, aliás de inúmeros bens, e datado de 9 de outubro de
1862. Em um dos poucos livros de óbito que ainda existem na secretaria
da paróquia de São Vicente Ferrer de Lavras da Mangabeira (1839-1864,
fls, 317-318), vê-se o registro de encomendação de sua alma, com 54
anos, pelo pe. José Maria Freire de Brito (padre encomendado), no dia 3
de março de 1863.
Sobre o referido testamento, recaem interessantes passagens, assim, ricamente trabalhadas no clássico São Vicente das Lavras (Fortaleza,
1984), autoria de um dos maiores historiógrafos nascidos do Ceará:
Joaryvar Macêdo, lavrense do Calabaço. Dessas passagens, sobre seu
testamento, salienta-se o que aqui se transcreve do referido ensaio, a
respeito de algumas vontades do pe. Luís: "Quero que o meu corpo esteja
vestido como se eu fosse celebrar, isto é, com sapatos pretos, meias de
seda preta, batina, alva, cordão, estola, manípulo e casula, o que tudo
tenho. Quero também que se me ponha na mão um cálice de prata, só
tirando quando eu tiver de ser sepultado."
Proveitoso se faz ressaltar, ainda, que uma grande quantidade de
objetos de ouro e prata foram deixados pelo sacerdote, assim como cerca
de 450 cabeças de gado bovino, 5 engenhos no termo de Lavras (São
Caetano, Bacupari, Canabrava, Limoeiro e Caraíbas), várias propriedades
(Calabaço, Fundão, João Ribeiro, Bacupari do Baixio, Pimentas,
Cachoeira, Alagoa Nova, Olho d'água - os três últimos em Sousa, PB),
além de 300 braças no sítio Logradouro, sendo que nestas haviam grande
quantidade de utensílios e implementos, assim como açudes e 12 escravos.
De Marica de pe. Luis, que após o trespasse do sacerdote contraiu
núpcias com Antônio Caetano de Galiza, narra-se que às madrugadas das
sextas-feiras, transformava-se numa mula que percorria as estradas do
riacho do Rosário, onde escaramuçava-se e espojava-se. Em face da
mancebia em que viveu com o padre, tornara mal-assombrado o trecho do
sítio em que moravam, no qual segundo a crendice popular, era comum
aparecerem visões. A respeito do funeral do padre, contava-se ter sido
acompanhado por gatos pretos e urubus do Calabaço até a matriz de São
Vicente Ferrer, e desta, ao cemitério, por garças. Estórias de botijas
enterradas eram apregoadas ainda, porém nunca se viu alguém ter tido
proeza à façanha, porquanto, poucos se arriscariam a desenterrá-las
visto à suposta aparição de um velho padre de barbas longas, lançador de
fogo pela boca.
Todavia, seu testamento foi passivo de requerimentos. Em 25 de julho de
1863, D. Joaquina Francisca de Sá reivindicava bens na qualidade de
"sucessora de seu finado filho...", declarando renunciar à metade da
herança à amásia Maria Joaquina do Espírito Santo, embora
estivesse no testamento instituído como herdeiros universais seus cinco
filhos. A convenção amigável, entrementes, dizia respeito apenas aos
bens deixados pelo vigário, requeridos por sua mãe, e mais
nada...
(*) Professor, pesquisador.
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